terça-feira, 27 de abril de 2010

Casamentos

Uma coisa que posso dizer do chileno é que esse é um povo casamenteiro. Desde que cheguei aqui (há pouco mais de um ano) já fui a 4 casamentos. Dois esse ano (!!!) e dois ano passado.

Fazendo uma comparação: em 2008 fui a dois casamentos (foi animado); 2007 um; 2006 nenhum; e assim por diante. Acho que, em média, um casamento por ano (desde 1990) é uma boa estatística.

Aqui, o povo gosta casar. Agora então que aprovaram o divórcio (a lei de divórcio deve ser de 2006 ou 2007), o povo está casando mais que nunca. De fato, dos 4 casamentos acima mencionados, 3 tinham ou noivo ou noiva ou ambos divorciados.

Em geral, as festas de casamento padrão aqui têm mais ou menos as mesmas coisas que no Brasil. Em suma, é um evento para o qual as pessoas se vestem como se fossem assistir uma ópera no Scala de Milão, mas acabam fazendo a Dança da Manivela. Então vamos às little differences.

1- Número de convidados. Uma festa de casamento bem padrão, tradicional, para 150 pessoas é considerada grande (pelo menos pelo parâmetro das pessoas com quem conversei). Uma festa para 300 pessoas é considerada gigante. Se eu tivesse a idéia maluca de fazer uma festa padrão de casamento no Brasil (e, principalmente, se estivesse no escritório) eu conseguiria juntar 150 pessoas antes de convidar o primeiro amigo pessoal. Fácil, fácil. Fiquei um pouco com a sensação que, se você trabalha num lugar grande e cheio de gente, você não tem muito a obrigação de convidar todo o andar ou coisa do gênero, mas preciso confirmar.

2- Todos os casamentos que presenciei tinham jantar sentado (e a comida sempre esteve boa). Não sei se existe aqui aquele conceito de casamento só com comidinhas para picar enquanto as pessoas circulam de um lado para o outro. Aliás, aqui tem uma coisa que eu só tinha visto em filme americano. Sabem aquelas listas de mesa com indicação de quem senta onde? Então.

3- Música. Aqui existe uma playlist casamento padrão. Uma série específica de músicas latinas(que eu obviamente não conhecia) sempre abre a pista de dança. São músicas que eu só escuto em casamentos e que escutei em todos os casamentos. Depois varia para Rock/Pop/anos 80 e a Dança da Manivela ou É o Tchan (nem o Rebolation nem o Créu chegaram aqui).

4- As igrejas tinham decoração bem mais simples do que normalmente se vê em SP. Nada daquelas cascatas de flores brancas e similares.

5- Em um dos casamentos que eu fui teve performance da noiva e em outro, de uma humorista local. Esse, aliás, foi a coisa mais doida que eu já vi. Era uma velhinha de lencinho na cabeça e cestinha na mão contando piadas num espanhol absolutamente incompreensível (inclusive para outros chilenos) e com uma entonação cadenciada muito esquisita. Passei o tempo todo rindo.

6- Não fui a nenhum bufê (acho que aqui não existe). Os casamentos foram ou em hotéis ou em restaurantes e uma amiga vai a um casamento num clube.

7- Em nenhum lugar eu vi cortarem a gravata do noivo.

8- As noivas não jogam o buque de verdade. Todas arrumam um buquezinho de flores artificiais e jogam, mas essa não é a única simpatia. Antes de cortar o bolo as mulheres solteiras são convidadas a puxar uma fitinha enfiada dentro do bolo. Quem puxar a fitinha com aliança presa na ponta será a próxima a casar. Eu peguei um buque e puxei uma pomba (não sei o que quer dizer).

9- E, por fim, a grande sacada chilena para casamentos. Sopinha na madrugada. Sabe aquela hora, três da madruga, quando está todo mundo começando a dobrar o cabo da boa esperança, já no ponto de ficar muito bêbado, dar vexame e dormir na mesa mesmo? Então, essa é o momento da sopinha. Normalmente é servido numa cumbuca um caldo de frango reforçado com ovo quebrado na água quente, manja? É perfeito.

domingo, 25 de abril de 2010

Prova de que eu não minto

Paul Schaefer - aquele da colônia dignidade - morreu ontem...

O cara era tão ruim, tão ruim que teve o último pedido (ser enterrado na colônia) negado pelos atuais moradores.

Hoje foi enterrado num túmulo sem identificação, provavelmente para evitar a depredação. Aliás, por essa mesma razão, o Pinochet foi cremado. Os caras sabiam, se enterrassem, o túmulo não durava um dia.

quinta-feira, 22 de abril de 2010

Marepoto

Não sei se isso é verdade (ou se editaram o discurso), mas como esse é um blog com zero de credibilidade, o que eu quero mais é divulgar bobagens.

Aparentemente o Piñera, em um discurso qualquer, estava fazendo tratando da reconstrução do Chile e proferiu a seguinte frase:

"por el terremoto que remexio la tierra bajo nuestros pies y por el marepoto (sic) que sacudió nuestra costa..."

Acontece que no Chile "poto" é a palavra comum, normal, para bunda.

Bem, nem precisa dizer...

Como os chilenos também tem "sentido" de humor começaram a pipocar vídeos no youtube zoando o pobre presidente de direita.

Lembro que se o Brasil tem o Axé (música apropriada para esse tipo de piada) a América latina tem o reggaeton.

link

O vídeo é besta mas o cara falando marepoto é divertido.

O Pior Comercial do Mundo

Nossa, faz um mês que eu não posto nada. Ando vagabuuuuunda!

Pois bem, como o título anuncia segue o link do pior comercial do mundo. Devo admitir que eu acho propaganda, de modo geral, uma coisa totalmente idiota. É raro um comercial que me agrade, mas esse é dos piores que eu já vi.

Na verdade, não sei nem por onde começar a detalhar tudo o que, na minha opinião, está errado, mas vamos ver:

a) Tudo bem que os caras querem dar enfoque no lance do leite ter "propriedades medicinais" mas colocar um "médico" para falar de comida eu acho o cu da cobra.

b) Se é para colocar um médico que pelo menos apresente uma credencial do cara, para dar um pouco de autoridade ao argumento. No caso, fica mais parecendo um enfermeiro de hospício.

c) A voz histérica que grita "que me lo cante" é péssima! O único sentido que vejo para isso é que, se a pessoa está distraída enquanto passa o comercial (o que é quase certo), ela pára o que quer que estiver fazendo para olhar a TV. Isso se chama golpe baixo.

d) A música é MUITO cafona.

e) A letra é pior ainda, caso vocês não entendam diz o seguinte (numa ortografia sem revisão): "Una leche para cada década/porque sus huesos necesitas cuidar/tu estomago ja no és el de los veinte/y tu corazón debes vigilar/ Una leche para cada década/ y sin lactosa si no puedes tomar/ Además vienem con prebióticos/ que ayudan a tu estomago funcionar. Na boa, se eu tô tomando leite e escuto essa música eu morro de indigestão na hora (não precisa nem de manga). Custa dizer que o leite é gostoso?

f) O tipo do cantor. Não tem como piorar. Nos comentários no youtube os caras dizem que é um mix de Kenny G com Arjona que é esse tipo aqui



Achei apropriado.

Acho até que o comercial é propositadamente ruim e tem o intento de fazer rir. Até aí, ok. O problema é que dá vontade de nunca mais tomar esse leite.

quarta-feira, 31 de março de 2010

Saqueo

A título de curiosidade, o negócio dos saques após o terremoto foi tão feio que até cachorro foi roubado.



Vejam bem a carinha do bicho de quem não tá entendendo nada.

Ele foi roubado de um pet shop que foi todo saqueado, mas já foi restituído.

Carrinhos de Compra

Ontem fui ao super com o Carlos fazer as compras de mês. Além do trivial também precisava comprar ervas, bacon e vinho branco barato para fazer o peru da páscoa (sim, o peru do Thiago é um sucesso).

Pois bem, na saída do mercado, após a transferência das compras para o porta-malas fui deixar o carrinho de compras em algum lugar minimamente adequado e que não causasse transtorno aos demais freqüentadores.

Sinceramente, detesto quem larga o carrinho em qualquer lugar! DETESTO. Você vem toda feliz com o seu veículo, vê uma vaga, vai estacionar e poin: lá está a porra do carrinho de compras que algum preguiçoso simplesmente decidiu deixar ocupando a vaga que um dia foi do seu veiculo. Tudo bem que o leite e o yogurt podem estragar se ficarem muito tempo fora da geladeira, mas isso não é desculpa para não levar o carrinho até um lugar onde ele, pelo menos, não atrapalhe as pessoas.

Pois bem, querendo fazer o que é certo, ergo minha cabeça e olho ao redor. Lá na frente há um canto cheio de carrinhos de compra abandonados. Então eu penso: é lá.
Levo o carrinho até o local e quando chego... Surpresa! Não era um estacionamento de carrinhos, era uma vaga de deficiente.

Claro que, da maneira como estava, qualquer deficiente iria precisar de um trator para estacionar ali, mas eu me recuso a participar e contribuir para uma palhaçada dessas. Dei meia volta e levei o carrinho até outro ponto, próximo da descida do estacionamento para o mercado e sabe o que? Nem perdi tanto tempo assim.
Aparentemente, a falta de neurônio é um problema universal.

PS: O sujeito do post abaixo foi destituído antes mesmo de assumir. Era demais mesmo.

sexta-feira, 19 de março de 2010

Dignidade

Mais um capítulo sobre o novo governo do Chile.

O atual escândalo - esse é dos bons - está relacionado com a nomeação do chefe de província de Bio-Bio (aquela que foi mais afetada pelo terremoto), ao sul de Santiago.

Apenas para esclarecer, chefe de província equivale ao que no Brasil seria o governador. A diferença é que, como o Chile não é uma Federação e, portanto, não está formado por Estados, não há eleições diretas para chefes de províncias. O governo central simplesmente indica alguém que passará os próximos quatro anos como administrador para questões regionais.

Dito isso, o novo governo acaba de anunciar que o Chefe de Província de Bio-Bio será o Sr. José Miguel Steigmeier (doravante denominado ZéMigué). Mas quem é ZéMigué?
Para dizer quem é esse sujeito primeiro preciso falar sobre a Villa Baviera ou, como era conhecida, a Colonia Dignidad.

Quando eu vim para cá, ganhei da Ferdi um livro da Isabel Allende chamado “Meu País Inventado”. Em pouco mais de 200 páginas, a escritora traça um retrato divertido, conciso e, até onde pude perceber, muito acurado do Chile.
Dentre os episódios mais bizarros está aquele dedicado à Colônia Dignidade.



Resumindo o livro e de acordo com informações de jornais e outras fontes facilmente identificáveis na internet (é só dar um Google tem informação para caramba) a história da tal colônia é mais ou menos o seguinte.

Existe no Chile, principalmente no sul, alguma imigração alemã (como você pode ver pela arquitetura da região dos lagos). A imigração é antiga, mas, após a segunda guerra, começaram a aparecer uns alemães meio diferentes por aqui.

Isso nem é tão estranho, Brasil e Argentina passaram pelo mesmo processo.

Aqui, no entanto, de acordo com a Isabel Allende, o anti-semitismo era muito forte e havia, inclusive, um partido nazista que gozava de razoável popularidade a ponto de desfilar na rua com suásticas etc.

Nessa toada foi fundada, nos anos 60, a tal Colonia Dignidad, ou em outras palavras, uma acampamento nazista que persistiu firme e forte até o século XXI.
A razão para sua longevidade seria a suposta proteção das Forças Armadas chilenas já que, no período da ditadura, o espaço da colônia teria sido usado como centro de tortura pelo serviço secreto. Enfim...

A colônia foi fundada por um tal de Paul Schäfer, que foi enfermeiro durante a segunda guerra e que, na colônia, se dedicava a atuar com jovens em situação de risco. Durante muito tempo era comum a divulgação de filminhos mostrando como as pessoas da colônia eram felizes e lindas, participando de festas comunitárias e trabalhando no campo (uma coisa meio Amish, mas com luz elétrica).





Em meados dos anos 80 começaram a surgir denúncias especialmente depois que um jovem alemão fugiu da colônia e, ao chegar na Alemanha Ocidental, denunciou Paul Shäfer por abuso infantil e outras práticas bizarras.

Ainda assim, o governo chileno (diga-se Pinochet) nunca fez muita força para averiguar se havia ali prática de abuso ou do que quer que fosse. Talvez porque a colônia supostamente ajudava o governo a produzir gás sarín e outras armas químicas, armas biológicas e convencionais.

Quando o governo militar caiu, iniciou-se algum processo de investigação acerca das denúncias de abuso, mas ninguém – absolutamente ninguém – dizia nada que pudesse comprometer Paul Shäfer ou outro membro da colônia.

Só quando Paul Shäfer foi preso na Argentina – e o pessoal da colônia se viu mais ou menos protegido do líder – é que as coisas começaram a aparecer. Além do abuso de menores, o rol de bizarrices do dia-a-dia da colônia incluía:

- proibição da formação de famílias e do sexo: os jovens não podiam casar nem namorar e os eventuais pais tinham que abandonar seus filhos que eram criados comunitariamente (ninguém tinham pai, mãe ou irmão). No fim, havia poucas crianças e ninguém sabe muito bem a origem das mesmas.

- a descoberta de um arsenal. O propósito das armas até hoje ninguém sabe, mas há suspeita de tráfico de armas, de planos para envenenar rios argentinos e sabe-se lá mais o que.

- a confissão de uma figura chamada Gisela Seewald que, seguindo ordens de Paul Shäfer, administrava sedativos e dava choques em crianças, que estariam possuídas por demônios.

- a identificação de uma rede de bunkers e tuneis usados na produção das armas e na prática de tortura.



- a existência de um manual de tortura da colônia.

O rol é infinito.

Aí vocês se perguntam: o que é que o ZéMigué tem a ver com tudo isso?

De acordo com processo já julgado, o ZéMigué movimentou dinheiro, por meio de paraísos fiscais, que simplesmente ajudaram Paul Shäfer a sobreviver enquanto ele fugia da justiça, antes de ser preso na Argentina.

O envolvimento do ZéMigué no caso, é bom que se diga, está comprovado não apenas por inúmeros documentos obtidos pela justiça como também pelo depoimento de um membro altamente graduado da colônia chamado Hatmutt Hopp.

Tá bom ou quer mais? Então tá.

Como se não bastasse tudo isso ele também é acusado de ter escondido Ángel Salvo uma das vítimas de abuso e que era procurado pela justiça.

Indicação polêmica é pouco! Vamos ver o que vai dar, se o tipo for colocado de escanteio eu aviso.

quinta-feira, 18 de março de 2010

PUC

Ainda nesse tópico, esqueci de mencionar que a PUC daqui é muito arrumadinha. Nada a ver com aquela zona que é o prédio novo em Perdizes ou mesmo os prédios do COGEAE (na Barra Funda e no Centro).

Em compensação, a PUC daqui é católica mesmo e com uma orientação opus-dei. E já ouvi dizer (mas não vi) que há professores que rezam antes das aulas.

Já pensou isso na PUC em SP?!

quarta-feira, 17 de março de 2010

Diplomado

Hoje fiz minha primeira aula.
Foi divertido, afinal, a vagabundagem já cansou faz tempo. Colocar a massa cinzenta para trabalhar um pouquinho mais faz bem. Atualmente, meus neurônios só se exercitam em atividades como ver filmes e aprender a baixar arquivos no torrent (atividade, na qual – diga-se – sou muito mal sucedida).
Para quem não sabe, estou fazendo diplomado na área de tributação.
Sim, eu sou masoquista, mas não se preocupem. Eu não pretendo fazer um cotejo entre os sistemas brasileiro e chileno.
Se é para fazer algum tipo de comparação, creio que posso fazê-la entre os sistemas de diplomado já que em São Paulo fiz especialização na PUC. Até porque, aqui o diplomado també é oferecido pela Universidad Católica.
A primeira coisa que me chamou a atenção foi o fato de que o diplomado pode servir como uma prévia para o mestrado. Significa que, se no final do ano, eu decidir partir para um mestrado, posso simplesmente exercer essa opção. Terei nesse caso mais um ano de estudos e os créditos já cursados valem para a obtenção do título.
Além disso, algumas aulas são ministradas pela manhã – o que não é muito comum para os cursos de especialização brasileiros (COGEAE, IBEMEC, GV, etc.), salvo quando o curso é realizado aos sábados.
O nível dos professores, até o presente momento, está muito bom. O modelo é o mesmo adotado no Brasil também (caras com carreira acadêmica que são também “profissionais de sucesso”).
O sistema de aulas é totalmente diferente daquele usado pelos cursos acima, que adotam o sistema maleta de seminários. Se por um lado a leitura de casos e a apresentação de seminários ajudam (e, porque não dizer, obrigam) o sujeito a estudar, as discussões prévias em sala de aula sempre me pareceram excessivas e bem inúteis.
Aqui, são aulas expositivas com espaço para perguntas etc.
Mas o que me chamou a atenção foi o controle de presença. Antes de cada aula (são três terça de manhã e duas na quinta à noite) a pessoa tem que assinar uma lista que fica na mesinha do lado de fora da sala de aula.
Sabe aquela idéia de que as pessoas são adultas e sabem se cuidar? Aqui não vale.
Quanto à qualidade geral do curso, só o tempo dirá.
E só atualizando: continua tremendo, mas com menos intensidade. O dia do apagão é que foi terrível. Fiquei morrendo de medo de ser um aviso de tremor, mas era só uma sobrecarga biruta.
Depois conto sobre os ETs que previram o terremoto e o tsumani que se seguiu.

domingo, 14 de março de 2010

Sem comentários

Esse vídeo é mais ou menos do mesmo tempo da Xuxa só que aqui no Chile.

O Carlos quando escutou a versão original tomou o maior susto: essa música é do Raul Seixas?

sexta-feira, 12 de março de 2010

Durante o Terremoto

Bem, voltando aos tremores. Começou a tremer e eu fugi de casa. Como estava sozinha, peguei o note e me mandei para a casa da minha sogra onde o Carlos trabalha. O pior foi eu me trocando embaixo do batente do quarto.

Peguei a mochila, a bolsa e me mandei.

Quando já tinha descido uns oito andares lembrei que estava fazendo torradas e tinha esquecido o forno ligado. Subi tudo de novo e depois desci outra vez.

Cheguei aqui morrendo de medo e estava o babado na troca de governo. Isso é que é posse agitada! As fotos da estão impagáveis. A cara de medo do povo olhando para o teto é surreal. E se cai o teto da bagaça, passava-se o rodo na política latino-americana. Só sobrava o Lula e o Chaves. Já pensou a capa da Veja!!!

Não gosto de ser bidu, mas me parece que, para o Piñera, esse terremoto não será tão mau negócio. Afinal ele vai ter uma desculpa excelente para não cumprir nenhuma das promessas feitas em campanha.

Na verdade, já até começou.

A primeira promessa que ele teria que cumprir (dentre as que havia feito) é que, no dia da posse, não teria mais nenhuma ação da LAN Chile. Por causa do terremoto, no entanto, ele não as vendeu. E aí você se pergunta: o que é que o cu tem a ver com as calças?

Eu nem sei se as ações perderam valor por causa do terremoto, mas, considerando que no dia seguinte da eleição, elas haviam sofrido grande valorização talvez a coisa tivesse equilibrado. Mas, ainda que seja esse o caso, o cara tinha prometido vendê-las não para fazer dindim com a venda, mas sim para evitar quaisquer suspeitas de interferência entre governo e empresa. Quem tá no mercado de ações tem que se sujeitar às intempéries, oras!

No mis, a volta para casa estava escutando rádio e o locutor, apropriadamente, lembrava que no período "pré-colombino" os povos nativos tomariam muito em sério a ocorrência de um terreoto no exato momento da troca de poder. Certamente, considerariam isso um importante pressagio. Se positivo ou negativo - indagava o locutor - caberia aos ouvintes decidir.

Depois do Terremoto

Depois de escapulir para São Paulo, bem a tempo de me salvar do quinto terremoto mais forte da história voltei para Santiago. Aliás, isso de terremoto mais forte da história é balela já que a medição de terremotos vem sendo feita apenas nos últimos 100 ou 200 anos, período geologicamente irrelevante, mas enfim: voltei.

As “novidades” começaram no aeroporto. O avião pousou e levou um baita tempo até que pudéssemos desembarcar. Isso acontece porque, como o prédio está interditado, primeiro as malas são enfileiradas na pista, ao lado do avião, e só aí os funcionários liberam as pessoas para que busquem seus pertences. Depois, você arrasta sua mala através de uma tenda de campanha onde está a imigração (cada funcionário com seu note) e depois o raio-x.

Uma vez liberado dos trâmites normais, saímos por uma passagem ao ar livre onde estão enfileirados os caras que fazem serviço oficial de taxi e van. No final da passagem ficam os parentes e amigos que aguardam seus entes queridos e o estacionamento.

No caminho do aeroporto para a cidade, pegamos algum trânsito graças a algumas obras que estão sendo feitas na estrada. Em certas partes o tremor abriu fendas que já estão sendo reparadas. Afora isso, não notei grandes diferenças.

O mesmo se pode dizer sobre o bairro onde moro. Por aqui, procurar marcas do terremoto é como um jogo de sete erros. Você olha e pensa: esse portãozinho estava assim zoadinho? E essa janela? Só quando fui visitar uma amiga do Carlos é que vi uma casa parcialmente despencada, com os tijolinhos na calçada, cercada por aquela fita amarela de polícia. Também perto daqui, a torre de uma igreja caiu.

A verdade é que, de modo geral, os prédios resistiram bem. Vejamos os detalhes.

Apesar de o aeroporto ter sido detonado, os prédios de Santiago, em geral, resistiram bravamente. Uma amiga do Carlos, que mora no vigésimo terceiro andar (ou algo assim) de um prédio bem antigo, por exemplo, perdeu a geladeira e o microondas, mas sua casa está intacta.

A história é que desde os anos 60, quando aqui se registrou o pior de todos os terremotos da história (relativamente), o país criou regras muito específicas para a construção civil e tais regras vêm sendo seguidas a risca.

O conceito de um prédio anti-sísmico, cabe dizer, é que ele não pode cair durante o evento. Isso não significa, no entanto, que após o terremoto ele siga sendo habitável. É possível que falhas na estrutura acabem por condenar o prédio, mas, pelo menos, todo mundo tem tempo de fugir.

Atualmente, há por volta 40 prédios interditados e um caiu. Pensando bem, até que não é uma má marca. Evidentemente, nessa estatística não entram construções antigas. Várias casas, igrejas e outros prédios caíram, mas não eram anti-sísmicos. Esses 40 são prédios novos, altos e “mudernos”.

Em princípio, portanto, verifica-se que as tais regras funcionam, mas há um detalhe interessante. Em 2005, as construtoras estavam que estavam reclamando. A fiscalização das obras, diziam, era muito demorada, burocrática e isso encarecia as obras, etc. Fizeram então uma lei que permitia que as próprias construtoras fiscalizassem o seguimento das normas de construção.

Bem. O prédio que caiu – aquele que saiu em todos os jornais – foi feito depois de 2005. Os prédios interditados? Depois de 2005. Mas pode ser só coincidência, claro. E também há outros fatores.

Em Santiago, a zona mais afetada foi a norponiente. Essa parte fica já na saída da cidade e, se tivesse que comparar, poderia dizer que é uma espécie de Alphaville comercial. Nesse setor existem algumas residências de alto-padrão (poucas, na verdade) e um centro empresarial, onde, além de prédios de escritório, há centros de convenções, hotéis, shopping.

Ali fica o prédio da NEC, onde o Carlos trabalhou e onde diversos amigos dele ainda trabalham. Ali, a casa caiu. A galera da NEC está trabalhando em sistema home office enquanto a NEC busca um lugar para se mudar. Simplesmente, uma VIGA caiu na sala do gerente geral. Fosse no Brasil, iam dizer que era macumba, olho gordo, mas aqui não tem muito disso. O hotel Radisson está interditado e parece que vai ser demolido. O shopping que ficava ali despencou inteiro.

Deve ter gente indo a pé até Aparecida para agradecer que o terremoto foi sábado 3:30 da madrugada e não 3:30 da tarde.

Aliás, foi nessa região que uma estrada despencou também.

Curiosamente, nenhum jornal daqui noticia qualquer desses desastres (fora o caso da estrada). Ficamos sabendo pelo povo da NEC.

Aparentemente, o terreno ali é mais instável, mas até aí, depois que uma VIGA cai em cima da sua mesa, quem é que quer saber.

Outra história que ninguém divulga seriam a dos supostos saqueadores que apareceram mortos na pracinha de uma das cidades mais atingidas no sul. Ninguém sabe quem foi, nem quer muito saber. Do jeito que a história apareceu também sumiu a tal ponto, que eu nem sei se é verdade ou boato.

Já em casa, está tudo tranqüilo.

Quando chegamos, minha cunhada e minha sogra já tinham dado uma mega arrumada na casa deixando pouquíssima zona para nós. Sei que os livros (todos) caíram das estantes, os porta-retratos voaram e a cama foi quase parar no banheiro. Na cozinha, muitos copos e as xicrinhas de café quebraram, o macarrão pulou de dentro do armário (sei porque estava colocado em lugar diferente do que eu costumo guardar) e algumas outras coisas balançaram,mas já estava tudo arreglado quando chegamos. Só o armário estava do jeito que o tremor deixou.

Em casa temos um closet de modo que o armário, propriamente dito, não tem porta (só a porta que separa o closet do quarto). Quando eu cheguei, a porta mal abria. A caixa de moedas do Carlos tinha voado e espalhado moedinhas para todos os lados. As roupas estavam todas espalhadas já que as prateleiras deslizaram pelo trilho e caíram. Pelo chão havia parafusos e casinhas do Banco Imobiliário. O secador de cabelo estava dentro do cesto de roupa suja. Só as roupas dos cabides resistiram.

No fim, até que foi bom. Fiz uma faxina daquelas de tirar pó de dentro das gavetas e ficou um brinco.

Mas o mais incrível foi o centro de entretenimento: o computador com 3 teras de informação. Embora o bichinho tenha caído de cabeça – a ponto de abrir um buraquinho no chão – ele sobreviveu (e as informações também). Computador Highlander é outra coisa. Agora ele vai morar no chão mesmo.


No mais, ficaram umas rachaduras pela casa. Elas aparecem exatamente no limite entre o concreto da estrutura e a parede mole (ou sei lá como se chama isso) e não afetam a estabilidade do prédio.


No fim das contas, o que mais matou e destruiu foi mesmo a tsunami.

Tá uma discussão doida, pois houve muita falha de comunicação. Ninguém avisou da tsumani, não tinha plano de fuga bem feito, nenhuma preparação. Daí ficou a merda mesmo.

Você vê uma série de histórias de gente que poderia ter se salvado, mas ficou lá, sem fazer nada, até a onda invadir e levar tudo. Tem história de tudo quanto é jeito.

A pior é da menina que avisou a família que estava acampando na praia e ninguém deu bola para a coitada. Ela subiu numa árvore e a família inteira morreu.

Tem também a pequena heroína de Juan Fernández (a ilha onde ficou o Robson Crusoé) que sozinha correu pela noite e tocou uma sineta avisando as pessoas do tsunami.

O que ouço muito dizer é que mais que perdas materiais o tremor afetou o orgulho já que o país não estaria tão preparado para o tremor quanto pensava.

O pior é que eu estava escrevendo e assistindo a posse do Piñera e começou a tremer de novo. Vou fazer outro post.